A vocação dos primeiros discípulos à união com Jesus começa com um encontro, encontro esse que os prepara para um chamamento posterior (cf. Jo 35-39). A apresentação de Jesus que passava é suficiente para que eles O sigam. Jesus dirige-lhes uma pergunta: “Que buscais?”. São as primeiras palavras de Jesus no Evangelho de S. João. Eles interessam-se pela Sua morada e onde mora. Chamam-lhe “Mestre” – o que significa que estão dispostos a aceitar os Seus ensinamentos e o estilo de vida. Jesus convida-os a partilhar com Ele uma casa e uma vida.

Aqueles discípulos entram na esfera da vida de fé. Não é uma teoria, mas uma experiência: “Vinde e vede”. A raiz da fé é a aceitação da pessoa de Cristo. Iniciaram com Ele uma relação pessoal. Anos mais tarde, quando se escreve o Evangelho, recorda-se o episódio como o início de uma nova vida. Está presente o pormenor da “hora”, insignificante para nós, mas não para quem o viveu: “Eram as quatro horas da tarde”. Os discípulos entram em contacto com Jesus com a ajuda de outras pessoas, e nós estamos chamados a pôr outras pessoas em contacto com Jesus, através do nosso testemunho e da evangelização. A relação de amizade é condição fundamental para se ser discípulo, e os futuros apóstolos continuam, por agora, com a sua vida de cada dia e os seus trabalhos da pesca.

Jesus inicia a escolha dos discípulos (cf. Lc 5, 1-11). Começa por se afastar da margem, isto é, os discípulos são chamados do meio da multidão e forma-os à parte; Pedro proclama Jesus inicialmente como “Mestre”, e depois da pesca como “Senhor”; confessa-se pecador e Jesus dá-lhe a missão de, no futuro, ser “pescador de homens”. Lançando-se aos pés, abre-se ao mistério da presença de Deus. Dessa mesma atitude participam os outros discípulos que ficam atónitos, isto é, cheios da presença de Deus. Intuímos aqui como vai nascendo a fé dos discípulos e especialmente a fé de Pedro, que confia plenamente na Palavra de Jesus. Eles adquirem a graça da generosidade necessária para deixar muitas coisas e para O seguirem. Esta graça, causada pela atração de Cristo, tem unida a si a confiança em Deus, que é maior que as nossas misérias e pecados.

Neste momento, é-lhes apresentada a sua missão como um trabalho interessante e de algum protagonismo – serem pescadores de homens. A cruz e a ressurreição virão como etapa final da sua união com Jesus.

A escolha dos Doze acontece quando Jesus sobe ao alto do monte, acompanhado por uma numerosa multidão (Mc 3, 13-19). Não estamos nas margens do lago, mas sim no alto de um monte. No Antigo Testamento, o “subir à montanha” costuma ter o significado de isolamento e de solidão. Moisés sobe à montanha para se encontrar com Deus (Ex 19-20) e S. Lucas diz que Jesus subiu sozinho ao monte para orar (Lc 6, 12). Tal como Moisés sobe à montanha para se encontrar com Deus (Ex 19-20), também agora Jesus sobe ao monte para escolher os doze apóstolos. De entre essa multidão “foi chamando os que Ele quis e reuniram-se com Ele”. Podemos ver no ato de chamar, algumas das dimensões do discipulado cristão: Jesus chama: é sempre Jesus quem chama e convoca os Seus discípulos; Chamouos que Ele quis: não se trata de uma eleição improvisada, mas sim muito ponderada e pensada;Reuniram-se com Ele: Jesus não chama apenas os Seus discípulos ao discipulado, mas escolhe-os de entre a multidão para formarem um grupo especial com Ele; Para que estivessem com Ele: a finalidade da escolha é para “estarem com Ele”, para O acompanharem e, por esta razão, realça-se a convivência física; Para os enviar a pregar: os discípulos prolongam a missão de Jesus e a sua pregação fundamental será a de darem testemunho do que viram e ouviram; pelo que é necessário que estejam com Ele.

Os Doze representam e são o fundamento do novo Povo de Deus (Lc 10, 1-11), que deve reunir todos os povos, tribos e nações. Todos são enviados. Isto significa que todos devem sentir a responsabilidade da evangelização e que ninguém se pode julgar dispensado.

Têm de praticar o que vão anunciar; a sua primeira pregação é o testemunho de vida. O não vestirem duas túnicas é para não se parecerem com os ricos, que as vestiam por se julgarem mais importantes. São enviados com a maior pobreza, porque a única riqueza que têm é a de Cristo.

A Igreja, continuadora da missão de Jesus, deve ser também libertadora de tantas escravidões que o homem de hoje sofre. Todos devemos deixar-nos imbuir de um autêntico sentido profético, o Espírito de Cristo Ressuscitado, que nos dá força para denunciar o mal e conquistar um verdadeiro espírito de liberdade interior.

No decurso da Última Ceia e no discurso de despedida, Jesus ora pelos Doze para que o Pai os mantenha na unidade e os consagre na verdade; assim poderão cumprir a sua missão no meio do mundo, ao qual não pertencem. A unidade que Jesus deseja para os Seus é fruto do amor que antes lhes inculcou no episódio do lava-pés (Jo 13, 1-20). A unidade existe na comunidade quando os seus membros se amam, de tal modo que cada um se entrega sem limites aos outros.

O ideal desta unidade dos discípulos é a mesma unidade trinitária: “Que sejam um como nós o somos”.Na intimidade de Deus a unidade é perfeita; são as relações mútuas que estabelecem a diversidade de pessoas. O homem, criado à imagem de Deus, é chamado a refletir na sua vida esta mesma realidade: é precisamente a relação mútua, o amor aos outros, que configura a verdadeira personalidade. Nesta abertura e relação interpessoal, transcende-se a individualidade de cada um, para ir ao encontro e se tornar presente nos outros. Dar-se significa tirar de si mesmo toda a potência do amor, que é o Espírito de Deus, sua força criadora.

A prova decisiva que torna o discípulo em apóstolo consiste na capacidade que tem em amar a Deus e amar os irmãos. Vemos isto claramente na aparição de Jesus aos apóstolos, nas margens do lago de Tiberíades, após a Sua ressurreição (Jo 21, 15-19). A pesca aparece muitas vezes no Evangelho como alusão à captação de seguidores do Reino. Realça-se a abundância da pesca, com referência a todos os povos e nações chamados a fazer parte da nova comunidade: é a universalidade da missão da Igreja.

O serviço no amor é a primeira exigência da comunidade dos discípulos de Jesus. Pedro não é eleito porque ama mais; exige-se-lhe sim que seja o primeiro no amor, e sê-lo-á até à morte. A ele é confiado o pastoreio deste Povo. No seio desta comunidade recebemos e lemos o Evangelho, e com ele alcançamos a plenitude da vida.

Enquanto comunidade edificada por Cristo, a nossa diocese de Aveiro deve rejubilar e dar muitas graças a Deus pelo nosso Seminário de Santa Joana, dedicado ao Coração de Jesus, e pelas várias instituições que o constituem: o pré-seminário, com cerca de 50 adolescentes e jovens em processo de discernimento vocacional; o seminário menor, com 7 jovens do 10º e 11º anos; e o seminário maior, com 8 alunos em teologia: três no propedêutico, três no 3º ano, um no 4º e um no ano pastoral. É também com muita alegria que anuncio à Diocese que no próximo dia 16 de novembro, no encerramento da semana dos seminários, na Eucaristia das 19 h, na Sé, serão instituídos no ministério de acólito o Gustavo Fernandes e o João Santos e, no dia 8 de dezembro, às 16 h, na Sé, será ordenado diácono, em ordem ao presbiterado, o Pedro Miguel Vieira Barros.

Temos de acarinhar o Seminário como sendo o coração da Igreja aveirense. A forma de nos tornarmos presentes é a intensificação da oração ao «Senhor da messe, para que mande operários para a sua seara» (Lc 10, 2), o acompanhamento por parte das paróquias da vida do seminário, a proximidade com os seminaristas e a ajuda económica, tão necessária nos tempos que correm. Lanço o desafio para que em todas as paróquias se crie um grupo de oração pelo nosso Seminário. Um outro gesto meritório será envidar esforços para o lançamento de uma campanha de bolsas de estudo para a formação de novos pastores para as nossas comunidades cristãs. Com coerência, criatividade e audácia, vamos todos dar as mãos e construir o futuro da Diocese.

À Mãe do Evangelho vivo, e com a intercessão de santa Joana, pedimos que interceda pelos sacerdotes da nossa Diocese para que sejam servidores da alegria do Evangelho e pelo nosso seminário, a fim de que o convite para esta nova etapa da evangelização, a que todos somos chamados pelo Papa Francisco, seja acolhido por cada um dos batizados e por todas as comunidades cristãs:

                        Senhor, nosso Deus, nós Vos bendizemos,

                        porque nos chamastes a ser cristãos

                        e discípulos de Jesus Cristo, o único Mestre.

                        Nós Vos damos graças pelos pastores,

                        que nos conduzem às fontes da Palavra,

                        ao banquete da Eucaristia

                        e aos caminhos da Reconciliação.

                        Nós Vos pedimos pela Igreja,

                        para que, testemunhando a alegria do Evangelho,

                        gere no seu seio santas vocações sacerdotais.

                        Por intercessão de Maria,

                        nós vos pedimos pelos nossos Seminários,

                        escola de cristãos, discípulos e pastores:

                        servidores da alegria do Evangelho.

                        Ámen.

 

† António Manuel Moiteiro Ramos, Bispo de Aveiro